quinta-feira, 24 de agosto de 2006

De que falamos quando falamos de oferta cultural em Vendas Novas?

.


Eis um exemplo do que pode ser considerado uma boa iniciativa cultural. Trata-se das "Noites de Verão", organizada pela autarquia/Câmara Municipal e que tem acontecido desde há vários anos em Vendas Novas e na Landeira. O concelho de Vendas Novas não tem uma oferta cultural por aí além. É um facto e já nos habituámos a isso. Mas nestas coisas, como em muitas outras, há que ter algum cuidado na abordagem, no sentido de sabermos do que falamos quando falamos de "oferta cultural", uma vez que a cultura é um conceito amplo, que engloba diversas vertentes da actividade humana.

Em Vendas Novas, a oferta cultural de iniciativa privada é quase inexistente. Por razões que não vêm agora ao caso, instalou-se no espírito da população a ideia de que cabe à autarquia a obrigação de organizar ou financiar tudo o que são eventos culturais. É um erro, que acaba por se estender a outras áreas de actividade com consequências algo negativas, sendo por vezes defendido mesmo por aqueles que, em face do seu pendor mais liberal, deveriam privilegiar uma maior envolvência das iniciativas privadas em detrimento dos poderes públicos.

Não tem existido, a meu ver, suficiente iniciativa privada de âmbito cultural em Vendas Novas. Nem através do chamado Mecenato Cultural, que poderia tomar a forma de parcerias entre várias entidades e/ou empresas do concelho, nem no âmbito de outras iniciativas privadas, tendo estas por objectivo uma qualquer actividade económica de cariz cultural. De que me lembre (mas posso estar naturalmente enganado), a primeira e única iniciativa que, neste contexto, teve lugar nos últimos tempos em Vendas Novas, foi a recente exposição de obras do mestre catalão Salvador Dali na Albergaria Acez. Não tenho conhecimento que aqui exista actualmente qualquer outra iniciativa não-publica de oferta cultural, por exemplo no âmbito da museologia, pintura, escultura ou actividades análogas, se exceptuarmos dois ou três artesãos que produzem artesanato em madeira e cortiça.

No que se refere ao cinema, teatro, música, pintura, escultura, aquilo a que se tem acesso em Vendas Novas é, salvo muito raras excepções, de iniciativa da própria autarquia. Algumas vezes em parceria com artistas a título individual os quais, eventualmente, também terão interesse em tornar públicas as suas obras. Noutros casos, através da organização directa de espectáculos de cinema, teatro, música, etc., ou de certames de carácter misto, em que se tenta aliar a cultura à economia. Há que valorizar estas iniciativas. Boas ou más, muitas ou poucas, tudo é relativo. O importante é que acontecem, e isso é positivo.

Deste modo, considero que dificilmente se poderá criticar, no que respeita à quantidade, a oferta cultural de iniciativa pública em Vendas Novas, atendendo aos constrangimentos financeiros com que se debatem as nossas autarquias. Já quanto à tipologia da oferta cultural, aí as opiniões divergem, o que é natural. Sobre isso, apesar de reconhecer alguma diversidade, gostaria de ver também em Vendas Novas outro tipo de eventos, embora tenha consciência de que poderá, ainda, não existir público suficiente por exemplo para espectáculos mais clássicos ou eruditos. Mas sobre isso tenho muitas dúvidas, pois como sabemos a cultura tem que ser cultivada, o que leva o seu tempo. Além de que a apetência por espectáculos ou iniciativas diferentes se ganha á medida que a eles se tem acesso. Ou não.

Embora crítico em relação à qualidade de alguma oferta cultural que tem existido em Vendas Novas, aprecio o facto de a autarquia se interessar por dinamizar alguns eventos e pessoas, no sentido de as cativar para o exercício da cultura. Aprecio, por exemplo, o acto de aqui existir uma sala de cinema, um grupo de teatro e uma biblioteca municipal. Embora também apreciasse se esta última optasse por dinamizar uma maior envolvência com a sua população-alvo. Acredito, no entanto, que no futuro os seus responsáveis acabem por se envolver numa tendência que a levará a conseguir alcançar esse desiderato, pois sobre essas matérias já são conhecidos exemplos bem sucedidos no nosso país.

Quanto às iniciativas privadas, tenho consciência de que a mesma tem contribuido muito pouco para melhorar o actual panorama da cultura em Vendas Novas. Mas também sei que a mesma já foi mais activa, designadamente no que respeita à igreja. O que significa que poderá voltar, no futuro, a ter um papel mais activo. Oxalá.

Sobre a relação entre a política e a cultura locais, continuo a ter dúvidas quanto à forma como, em Vendas Novas, os poderes públicos apoiam, ou não, as associações concelhias de carácter cultural ou recreativo. Serão dúvidas baseadas no facto de eu privilegiar uma abordagem digamos, diferente, do que deveriam ser os critérios para atribuição dos diversos tipos de ajudas/incentivos a essas entidades. Tenho, por isso, uma maneira diferente de ver as coisas. Isto porque, em minha opinião, há formas mais eficazes de incentivar o exercício de actividades de cariz cultural, sem custos acrescidos para a autarquia, mas que ainda não terão sido tentadas em Vendas Novas. Razão pela qual, pela minha parte, continuo a não concordar com a forma como estes assuntos aqui têm sido conduzidos.

Por tudo isto, em resumo, entendo que a oferta cultural em Vendas Novas apresenta um perfil demasiado desiquilibrado em termos de público vs privado. E, consequentemente, uma relação de grande proximidade e demasiada dependência com os poderes instituídos.

3 comentários:

Carla disse...

Passei por aki e aproveito para te desejar um bom domingo.
Bjx

João Fialho disse...

Um óptimo domingo tb para ti, Nadir.
Extensível, claro, a todos os nossos amigos visitantes aqui do blogue.

Saudações amigas para todos.

Anónimo disse...

DE QUE FALAMOS QUANDO PENSAMOS FALAR DE OFERTA CULTURAL EM VENDAS NOVAS?

Pois é, eventos de carácter cultural, são muito mais do que meras manifestações artísticas, e não têm nada a ver, muito longe disso, com eventos, por muito frequentes e repetidos que sejam, de carácter lúdico.

Aquilo a que se assiste em Vendas Novas é mormente de iniciativa pública, e não será muito mais do que uma tentativa de manter a população, ou parte dela, sobretudo aquela que representa a sua base política de apoio, mais ou menos entretida e mobilizada.

Fica-me, no entanto, a dúvida se existe em Vendas Novas “massa crítica” para outro tipo de iniciativas, essas sim de verdadeiro carácter cultural, tendo presente que muito daquilo que aos olhos de uns é cultura, para outros, não passará de uma grandessíssima seca.

O caso da exposição Salvador Dali na Albergaria ACEZ, exposição da qual não obtive qualquer “feedback” relativamente ao interesse e afluência de público, é um caso paradigmático de parcerias entre município e privados, que devem ser estimuladas e repetidas, se possível com maior frequência, no futuro. Se o êxito das iniciativas, porventura, não estarão sempre assegurados, será sempre salutar abrir o leque das ofertas dos eventos e, consequentemente, atingir e captar uma camada de público o mais abrangente possível quer em termos etários, sociais e políticos. Todos não serão demais!

O autor do post inicial disse que isto de cultura também se aprende, e é bem verdade; poucos são aqueles que nasceram predestinados para a cultura sendo o gosto por ela, na maior parte dos casos, aprendido e desenvolvido ao longo dos anos e, não raras vezes, terá surgido, inesperadamente, numa determinada fase das nossas vidas.

Um bom resto de domingo a todos!