segunda-feira, 6 de novembro de 2006

"A todo o vapor"

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COM A CHEGADA DO CAMINHO DE FERRO, VENDAS NOVAS DESENVOLVE-SE A “ TODO O VAPOR “

Comboio a vapor!... o grande avanço tecnológico em matéria de transportes terrestres, de meados do século XIX…

O caminho de ferro trouxe um contributo decisivo ao desenvolvimento de Vendas Novas, então aldeia já com alguma relevância pela sua situação geográfica, ponto de passagem quase obrigatório dos caminho de e para sul da capital.

A PRIMEIRA INFLUÊNCIA POSITIVA
Curiosamente, o caminho de ferro fez-se sentir de modo positivo no povoado, pela primeira vez, quando D. Pedro V recusou ceder o “ Palácio das Passagens “ (actual sede da E.P.A.) à Companhia de Caminho de Ferro que nela se pretendia instalar. O Rei, por sua vontade e petição dos vendasnovenses, que queriam para o Palácio uma mais nobre utilização, decidiu instalar nele (Portaria de 18-03-1861), a unidade militar que é hoje a E.P.A. (que, ela própria, viria a ser um dos mais importantes factores de desenvolvimento de Vendas Novas.


A LINHA DO SUL É CONSTRUIDA ATÉ VENDAS NOVAS
O documento mais antigo que conhecemos sobre a Linha do Sul é a “consulta” proferida pelo Conselho de Obras Públicas, em 19-04-1854, sob proposta do marquês de Fialho e de Eugénio de Almeida, representantes da “Companhia dos Caminhos de Ferro ao Sul do Tejo”, que se propunha construir a linha de Aldegalega (Montijo) a Vendas Novas. A companhia assinou em 24-07.1854 o contrato de construção dessa linha e sua exploração, depois de transferida a origem da mesma para o Barreiro, votando o Parlamento a confirmaçã
o do contrato nesse mesmo dia (Carta de Lei de 07-08-1854). O concurso para a construção foi adjudicado com a subvenção de 7 Contos e 900 mil Reis por quilómetro, à sociedade de Tomás Ramos, tendo a linha a bitola de 1,44m. Em Maio de 1858 os comboios já circulavam até Bombel.

UMA EPIDEMIA DE FEBRE AMARELA
Com a obra da linha perto de Vendas Novas, surgiu entre os trabalhadores uma epidemia de febre amarela. Para os tratar foi improvisada uma enfermaria no “Palácio das Passagens”… mas os trabalhos não foram interrompidos…

AS ACÇÕES DA COMPANHIA DO CAMINHO DE FERRO
Para financiar a sua actividade, a “Companhia dos Caminhos de Ferro ao Sul do Tejo” emitiu 14.000 acções nominais (em francês, português e inglês). Recordamos o registado numa
delas: “Companhia dos Caminhos de Ferro ao Sul do Tejo – caminho de ferro Barreiro – Vendas Novas com ramal para Setúbal – capital de 1.4000.000 Reis, dividido em 14.000 acções de 100 mil Reis – este título de 100 mil Reis, pertence ao Ilmo. Sr. Francisco Melo Soares de Freitas. Por conta tem pago até esta data 80%, assim tem recebido os juros vencidos até esta mesma data. O possuidor deste título tem direito aos juros e lucros que lhe pertencem, conforme o Artº 14º dos Estatutos da Companhia – Lisboa, 31-12-1858 – os Directores: Costa Ramos, António Gomes, João Pedro Costa”.

É INAUGURADA A LINHA BARREIRO – VENDAS NOVAS
Em “Correio Português – Um Guia Sentimental”, Francisco Viegas e Maurício Abreu, referem: “Em 1861 inaugurou-se a linha Barreiro – Vendas Novas… só em 1863 a linha do sul arrancou até Évora e no seguinte até Beja…” A linha até Vendas Novas teve inauguração oficial em 23-01-1861 e terá sido então também inaugurada a Estação de Vendas Novas.

A VIAGEM DE COMBÓIO BARREIRO – VENDAS NOVAS, NOS SEUS PRIMEIROS TEMPOS…

Para os viajantes que vinham da capital, a travessia do Tejo, nesses tempos pioneiros, era demorada. O barco a vapor que levava os passageiros ao Barreiro não podia atracar – não havia cais adequado – e fundeava a alguma distância. Fazia-se o transbordo dos passageiros, bagagens e mercadorias, para a margem do rio em pequenos barcos. Com mau tempo tudo se complicava… Depois tomava-se finalmente o comboio a vapor… a viagem Lisboa – Vendas Novas fazia-se “no tempo incrivelmente curto – dizia-se na época – de cerca de quatro horas e meia… se tudo corresse pelo melhor…

A LINHA AVANÇA; MAS EM BITOLA DIFERENTE…
O prolongamento da linha de Évora e Beja – proposta de lei do governo, de Junho de 1858 – foi aprovado pelo Parlamento e esse prolongamento foi contratado com J. Valentine, representante da “Companhia Inglesa” de Mengles, Chapman, Netman e Towsend. Mas a nova linha foi construída na bitola de 1
,66m, imposição de D. José Salamanca, por ser essa a bitola espanhola. Com a bitola de 1,44m do Barreiro a Vendas Novas e de 1,66m a partir daqui, era necessária a mudança de comboio na estação de Vendas Novas, com transbordo de passageiros, bagagens e mercadorias, tornando-a numa das mais importantes ao sul do Tejo… Em 1867 um litígio entre o Estado e a Companhia levou o tribunal arbitral a dar razão ao Estado, que entrou na posse do património da companhia inglesa por 2.376 contos e 653 mil Reis. Só então foi unificada a bitola da linha…

QUAL A PRIMITIVA LOCALIZAÇÃO DA ESTAÇÃO DE VENDAS NOVAS?
Existiam indicações que situavam a primitiva estação de Vendas No
vas na Boa Vista… teria sido assim?... Escreve em 23-09-1987, Rosa Marques, Vendasnovense e ferroviário: “O caminho de ferro do Setil a Vendas Novas só aqui chegou em 1904, quando se fez o apeadeiro do Vidigal. Morreu o rei, fechou o apeadeiro. Isto contado por pessoas desse tempo. Porém é do meu tempo que a sede da Casa de Bragança era na na rua da Estação de Caminho de Ferro, com costas para o quartel da E.P.A. Era dali que partiam as locomotivas para a Boavista, esperar o rei, para o conduzir ao palácio do Vidigal, pois era na Boavista que o comboio parava para desembarcar a família real…Depois de construídos os apeadeiros de Bombel e Vidigal acabou esse serviço…”

Assim, a estação de Vendas Novas sempre se terá situado no local onde hoje se encontrahavia até a chamada “rotunda das máquinas”. Mas quando o rei e sua família se dirigiam ao Vidigal, existia um local mais discreto, na Boavista, que servia de “estação” ou “apeadeiro real”, longe de eventuais olhares da população e de eventuais demonstrações de desagrado para com a monarquia…

A CASA DE BRAGANÇA E A LINHA DO SUL
Quando da construção da Linha do Sul, o rei D. Luís, que administrava a Casa de Bragança, de seu filho, menor, Duque de Bragança e futuro rei D. Carlos I, como a referida casa era um morgado, via-se impossibilitado de oferecer o terreno para a linha, entre Bombel e Vendas Novas. Procedeu-se, então, a uma permuta e o terreno foi cedido em troca da construção pela companhia, da estação de Bombel, que iria servir a “sereníssima casa”.

Em 1904, quando foi construída a linha do Setil, sendo já D. Carlos, rei e administrador da sua casa, verificou-se situação idêntica. Nessa altura os terrenos foram cedidos em troca da construção, pela companhia, nas propriedades da Casa de Bragança, de várias passagens de nível (algumas com casa e guarda de linha), como a dos Caminhos e Vale de Boi, Vale de Pegas, Bica Fria e Quinta do Pessegueiro. A companhia teve também de construir o apeadeiro do Vidigal, para serviço da Casa de Bragança, e um cais na estação de Vendas Novas para escoamento dos produtos agrícolas da “sereníssima casa”.

A LINHA DO SETIL

Com o comboio a chegar a Vendas Novas e depois a seguir para o sul, a terra entra numa fase de grande desenvolvimento. Muitas empresas, em especial da área corticeira, interessam-se pela aldeia, pois o caminho de ferro era um meio rápido e fiável para a recepção de matérias primas para as suas fábricas e de exportação de produtos manufacturados para o país e estrangeiro, dada a proximidade e ligação aos portos de Setúbal e Lisboa.

Essas empresas começaram a instalar as suas fábricas em Vendas Novas, originando um surto industrial sem precedentes na região. Com as fábricas (tal como acontecera com a E.P.A. com a vinda dos militares) vieram os dirigentes, os técnicos, os operários e seus familiares…alguns constituíram mesmo as suas famílias na aldeia… a população aumentou rapidamente, bem como o comércio local. Abriram-se novas ruas, construíram se novas casas. Surgiram as primeiras colectividades, incrementou-se a instrução… surgiram novos hábitos… Vendas Novas, embora de modo desordenado e com muitas carências (não havia apoio suficiente do município – Montemor), tornou-se um importante centro industrial e comercial ao sul do Tejo…

CAMINHO DE FERRO E VENDAS NOVAS – UMA COEXISTÊNCIA DE 150 ANOS…
Passou o tempo… o caminho de ferro continuou a servir Vendas Novas… e se a terra beneficiou com o advento do comboio, também alguma coisa deu à exploração do caminho de ferro… Uma situação geográfica privilegiada para estação terminal da linha e depois ponto de transbordo entre caminhos de bitolas diferentes…e continuou a ser estação importante de entrada e saída de passageiros e mercadorias, de abastecimento das locomotivas em água e carvão e de pequenas (algumas talvez maiores) reparações de material rolante… Vendas Novas acolheu também, de braços abertos o pessoal ferroviário – dos chefes de estação ás guardas de passagem de nível – e as suas famílias, muitas constituídas no povoado… a todos Vendas Novas fez sentir que estavam na sua terra e em sua casa…

ARTUR ALEIXO PAIS
14-10-2006

9 comentários:

Anónimo disse...

Excelente!
Um grande obrigado ao Sr. Artur Aleixo Pais, por partilhar com os demais estes seus magníficos pedaços da História de Vendas Novas.

Anónimo disse...

Sendo Vendas Novas uma Cidade de passagem e ponto de encontro de várias vias, nomeadamente:
- Estradas, ferrovias, marítimas (ribeira do moutal), e com um potencial de desenvolvimento bastante grande, e bem aproveitado pelos nossos governantes, que logo decidiram construir a Estação Rodoviária bem junto da estação da CP.
Assim quem vier de comboio e precisar de apanhar um autocarro ou vice-versa tem a vida bastante facilitada, pois só tem que sair da Estação e andar mais ou menos 400 metros com as malas e os sacos às costas, porque Vendas Novas é uma cidade virada para o Futuro, e queremos que os nossos visitantes voltem sempre com um sorriso nos lábios.
Se não quizer dar esses passinhos, só tem que esperar pelos autocarros camarários que diáriamente percorrem o Concelho, e fazem esse trajecto de 5 em 5 anos (o ùltimo passou há 8 dias).

Anónimo disse...

O Sr. MouTal há-de experimentar o
comboio/automotora( !...)-das 06H45 (+ - )para o Barreiro.Repare nos viajantes.....Melhor será O Intercidades das 09H40 que passa pela Ponte 25 de Abril e chega a Entre-Campos às 10H40 o que é excelente.O preço do bilhete é que é menos excelente.Quem viaja a preços mais especiais-militares,forças de segurança..-e gratuitamente-funcionários da Refer,familiares directos,juízes...é quem utiliza hoje em dia este meio de transporte diàriamente.Quem tem de estar no emprego às 09 horas em Lisboa não pode utilizar este meio de transporte!E Lisboa em 2006 é já ali.
Alternativa- barcos do Montijo-Sr. MouTal experimente,e vai ver como
os catamarãs da Transtejo contribuem hoje em dia para o desenvolvimento de Vendas Novas.

bomdebola disse...

Felicito o Sr. Artur Aleixo Pais por partilhar com todos nós mais este importante capítulo da história de Vendas Novas.

Particularmente interessante a questão das bitolas diferentes que obrigava ao transbordo de passageiros e bagagens em Vendas Novas.
Mais ou menos o que se passa agora no Barreiro, 145 anos depois, quando somos obrigados ao mesmo ritual para chegarmos a Lisboa.

É tudo uma questão de diferença de bitolas.

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

Peço desculpa ao solícito anónimo anterior, mas ainda ficou por dizer o nome e nº de telemóvel dos maquinistas na eventualidade de algum atraso…

Anónimo disse...

Se não querem ser desonestos digam o preço do regional V. Novas -Pinhal Novo e o do Intercidades (só mais do dobro). Digam também como viajam as pessoas de S. João das craveiras, Pegões, Fernando Pó e Poceirão. Como é limitada a visão estratégica para o desenvolvimento de uma região. Há pessoas em Vendas Novas que já têm os tiques de quem vive nas cidades e está-se nas tintas para os que consideram campónios. Esquecem-se que alguns desses campónios estudam em V. Novas e ficaram marginalizados pela CP e ao que parece por V. Novas.

Anónimo disse...

Que excelente comentário que termina referindo "É tudo uma questão de diferença de bitolas".

Anónimo disse...

A propósito de bitolas.Então com as primeiras chuvas a sério deste Outono lá ficámos sem comboios de Norte a Sul! A remodelação da linha do Norte-400 milhões de Euros-foi posta à prova pela Natureza e ainda por cima na estação de Fátima-região-numa zona montanhosa.Responsáveis ? Vamos a ver se temos o caso da Ponte de Entre-os-Rios,em que os responsáveis " desapareceram" ou não existem.
Com o TGV não vai haver problemas deste género !!!!!!!!!!..........